Anexo 1: Very
Important Punks (autores mais conhecidos de BD punk)
O britânico Simon
Gane (1972?) seria daqueles nomes que na BD dirá pouco, porque a sua obra
não é particularmente inovadora mas é um autor reconhecido na cena punk, ou
pelo menos era nos anos 90. Diz-se que não há fanzine punk que já não tenha
publicado, com ou sem consentimento do autor, imagens da sua personagem “Arnie,
The Anarchist”, série essa que tem a lógica da tira humorística num
micro-universo em volta das questões da Anarquia. No seu auge na cena punk
ainda ilustrou centenas de capas de discos, cartazes e outra efémera. Hoje,
parece que Gane é um autor como muitos outros no grande mercado
norte-americano, trabalhando para editoras conhecidas como a Top Shelf e a DC
Comics. Se Gane recebeu o título “king of punk comics” foi por reconhecimento
na cena punk e não pela BD, claro.
A BD aliás tem esta tendência a ser um clube de rapazes
bem-comportados devido à sua pesada história da BD comercial que parece devorar
tudo e todos fora desse parâmetro. Talvez por isso seja raro haver autores como
o francês Mattt Konture (1965) que
tem uma legião underground de leitores. Konture vem da cultura punk – onde
aliás, continua – como artista gráfico e como músico mas ao contrário de Gane,
a BD que realiza é sobre essa realidade na primeira pessoa, embora muitas vezes
o seu trabalho passe pelo automatismo, experimentalismo e psicadelismo como se
verifica na sua única BD publicada em Portugal na revista Quadrado #2 (3ª série, Bedeteca de Lisboa; Set’00). Ele e outros
cinco autores foram responsáveis pela criação da editora L’Association, em
1990, que modificou para sempre a BD europeia, em grande parte pela abordagem
da autobiografia à BD. O seu estilo gráfico é misto do “brutismo” (Art Brut e
estética lo-fi do punk) e uma tradição abonecada que ainda vem do underground
dos anos 60, sendo Robert Crumb uma influência assumida de Konture.
Nos EUA, é impossível não referir aos três irmãos Hernandez que criaram a revista Love & Rockets (título que os
ex-Bauhaus roubaram sem vergonha) em 1981 e que é um marco histórico para o
subsequente movimento da “BD alternativa” que cresceu daí até ao fim do século
passado. Um dos irmãos, Jaime
(1959), realizou nesta publicação a série “Locas” que tratava da vivência no
meio punk/ hardcore da Califórnia. Os Hernandez apesar de não realizarem
registos autobiográficos como Konture, as histórias que contam são fruto dos
seus encontros quotidianos com a comunidade latina em que se inserem, o que imediatamente
as torna importantes num contexto sociológico de testemunho de uma minoria
cultural norte-americana. Não só uma minoria latina que representam mas,
curiosamente, também de um testemunho feminino na cultura punk/ hardcore, uma
vez que a maioria das personagens dos Hernandez são mulheres. Em trinta anos
mantiveram a revista e as suas séries, com algumas interrupções pelo meio, o
que permite fazer uma análise de “aging” sobre estas personagens fictícias mas
que transpiram realidade pelos poros. Resta dizer que o estilo gráfico deles é
tradicional, realista, Pop estilizado a lembrar o grafismo dos anos 50 mas a
preto e branco – obrigatoriamente pela questão de custos de impressão da
revista. À superfície o que interessa mais será o conteúdo do que a estética
por mais que uma das personagens costume usar “patches” de Black Flag.
A antítese dos Hernandez (e dos outros) será o texano Gary Panter (1950) cujo desenho
“deficiente” e “ratado” é largamente influenciado pela liberdade estética que o
punk trouxe. Ele próprio foi ilustrador e autor de BD para um fanzine punk, Slash, entre 1977 e 1980, desenhou
material gráfico para várias bandas, sobressaindo-se como um importante artista
gráfico. O problema será saber se as BDs de Panter contam algo realista sobre o
punk e à partida a resposta será “não”. No máximo poderá contar que houve (ou
há) punks com muito ácidos e vindos da província como o seu Jimbo mas como o mundo onde esta
personagem se move é demasiado instável para o posicionarmos onde quer que for
- mesmo quando a cara de Jimbo tenha sido inspirada pela do vocalista dos The
Screamers. Panter é um exemplo como o primitivismo estético do punk foi
rapidamente assimilado pelos artistas dos anos 80, fazendo dele uma figura de
vanguarda nessa década quando publicava na seminal Raw, revista dirigida por Art Spiegelman.
Bibliografia
Cortesão, Ana; A minha vida é um esgoto; Lisboa : BaleiAzul
: Bedeteca de Lisboa; 1999
Deus, A. Dias de; Os
Comics em Portugal : uma história da banda desenhada; Lisboa : Cotovia :
Bedeteca de Lisboa, 1997
Farrajota, Marcos; Komikazen : cartografia dell'Europa a
fumetti; [Veneza] : Edizioni del Vento, 2007
_____; Noitadas, Deprês e Bubas; Cascais : Associação Chili
com Carne; 2008
_____; Talento Local; Cascais : Associação Chili com Carne;
2010
_____; Metakatz; Bruxelas : 5éme Couche, 2013
Guerra, Paula; Quintela, Pedro; Dolbeth, Júlio; God save the
Portuguese fanzines. Porto: Universidade do Porto – Faculdade de Letras; 2014
Holmstrom,
John; Hurd, Bridget; The Best of Punk Magazine; Nova Iorque : HarpersCollins,
2012
Isabelinho, Domingos; Tinta nos nervos : banda desenhada
portuguesa; Lisboa : Museu Colecção Berardo, 2011
Lisboa; Noites de Vidro; Câmara Municipal - Pelouro da
Cultura; 1991
Marte; Fazenda, João; Loverboy, o rebelde; Lisboa : Polvo;
1998
Martins, Fernando; Pop dell'arte; Lisboa : A bela e o
monstro, cop.; 2011
Mascarenhas, João; Punk Redux; Sintra : Qual Albatroz; 2011
Mendes, Marco; Salão Olímpico 2003-2006; Porto : Fundação de
Serralves, 2006
_____; Diário rasgado : 2007-12; Porto : Mundo Fantasma;
2012
Nunsky; 88; Cascais : Associação Chili Com Carne; 1997
Pestana, Teresa Câmara; Aqui? Babilónia; [s.l.] : Edição
Infecta; 1995
Pestana, Teresa Câmara; Continuamos aqui?; [s.l.] : Edição
Infecta; 1996
Piedade, Luís; Raridades; [s.l.] : Zerowork Records; 2008
Relvas, Fernando; Sangue Violeta e outros contos; [s.l.] :
El Pep; 2012
Ribeiro, Ana; Farrajota, Marcos; Martins, Ricardo; Boring
Europa; Cascais : Associação Chili Com Carne; 2011
Rigo 23; Ganmse; Lisboa; 1986
Sá, Leonardo de; Lino, Geraldes; Dédalo dos fanzines : o
catálogo das publicações amadoras de banda desenhada em Portugal; Lisboa : Edições
Temporárias : 1997
Sabin,
Roger; Triggs, Teal; Below critical radar : fanzines and alternative comics
from 1976 to now; Hove : Slab-O-Concrete, [2001?]
Saraiva, Nuno; Zé Inocêncio : as aventuras extra ordinárias
dum falo barato; Lisboa : BaleiAzul : Bedeteca de Lisboa; 1997
Spencer,
Amy; DIY : The Rise of Lo-Fi Culture; Londres : Marion Boyars, 2005
SWR
Barroselas Metal Fest; Farrajota, Marcos; The 15th rebellion of the steel
warriors; Barroselas : Sonic Events; 2012
Vieira, Joaquim; Portugal Século XX : Crónica em Imagens :
1950-60; Lisboa : Círculo de Leitores; 2000
Zink, Rui; Literatura gráfica? : banda desenhada portuguesa
contemporânea; Oeiras : Celta, 1999
Jornais e revistas
- Blitz (1990-92). Lisboa : VASP Sociedade de Transportes e
Distribuição
- Quadrado, 3ª série (2000). Lisboa : Bedeteca de Lisboa
- Stripburger (2013). Ljubjana : Forum Ljubjana
- Tintin (1979-1982). Amadora : Livraria Internacional, lda
Sites
- chilicomcarne.blogspot.com (da Associação Chili Com Carne)
- mesinha-de-cabeceira.blogspot.com (de Marcos Farrajota)
- rocknoliceu.blogspot.com (de André Nascimento)
- vimeo.com/75151697 (de Miguel Nozolino)
Zines:
- Buraco (2012). Porto
- Cru (2012-2014). Póvoa de Varzim : Esgar Acelerado
- Gambuzine (1999-2008). Porto : Edição Infecta
- Mesinha de Cabeceira (1992-2015). Cascais : FC Kómix
- Prego (2011). Vila Velha : Alex Vieira
Entrevistas
- Diniz Conefrey (Abril 2014) por e-mail
Sem comentários:
Enviar um comentário